sexta-feira, 29 de agosto de 2014

A Pedagogia dos Valores




Já escrevi anteriormente sobre este tema, dos jovens, do seu presente e do seu futuro, mas também dos seus pais e encarregados de educação e da forma como interagem uns e outros sabendo das responsabilidades inerentes no plano dessa interacção.

Bem sabemos que o paradigma dos adoslescentes e jovens de hoje é bem distinto do de há três ou quatro décadas atrás, contudo há coisas que nunca mudam.  Mas na  verdade, para as actuais gerações de pais e educadores, ou mesmo desde há uma ou duas gerações para cá, essas coisas de que falo, e que nunca mudam, foram simplesmente banalizadas ou completamente relativizadas e o resultado disso espelha-se nos comportamentos que observamos nos adolescentes e jovens  e nas consequências que eles traduzem.

Não quero trazer à colação os meus valores cristãos para que não se diga que este pequeno texto reproduz ideias feitas ou influências de vínculo religioso . Quero  apenas olhar para algumas pequenas/grandes diferenças que encontro entre a matriz educacional e de valores ( as tais pequenas coisas que nunca mudam ) que foi  transmitida à minha geração e a mais uma ou duas gerações posteriores à minha e que, por muito que me esforce, não consigo encontrar na generalidade das actuais gerações de jovens nem de pais e educadores.
Longe de mim reivindicar a ideia do retorno ao trabalho infantil ou algo parecido, porém a minha geração aprendeu desde cedo o valor do trabalho, a sua dificuldade, a sua necessidade e recompensa enquanto factores de evolução pessoal e humana, fosse na escola ou fora dela  na ajuda aos familiares nas mais diversas tarefas domésticas ou mesmo em pequenos trabalhos agrícolas, oficinais ou outros.

Nas férias grandes era seguro e sabido que não ficaríamos a curtir o corpo na cama até às duas ou três da tarde mas que teríamos de acompanhar os nossos pais ou educadores até ao seu local de trabalho e ali permanecer grande parte do dia, ou então ser-nos-ia encontrada uma ocupação, a troco de uma pequena remuneração, num qualquer comércio, escritório ou oficina afim de não ficarmos entregues a nós próprios em casa ou na rua.  Se gostávamos ?  Claro que não !  Mas nada disso nos retirava o tempo para a brincadeira e convívio com os amigos ao final da tarde. Os serões, sentados nas soleiras das portas a ouvir histórias dos adultos ou a observar as estrelas no firmamento e a aprender eram uma animação e uma experiência irrepetível nas nossas vidas.  Sorvíamos cada momento,  cada experiência,  cada história.   Hoje o que vemos é os adolescentes completamente desocupados ou envolvidos com os seus gadgets quase todo o tempo que estão acordados. É a isso que se resume o seu pequeno mundo somado aos encontros de grandes grupos que pululam nas ruas até de madrugada quer provocando desmandos ou ruídos inadmissíveis, quer grafitando paredes de prédios com caracteres meio góticos  que só a sua tribo entende. Hoje o que observamos nos pais e encarregados de educação é a preocupação em rodearem, a uso e a desuso, os seus filhos e educandos de todo o conforto possível e impossível, a propósito ou despropósito, merecido ou imerecido sem que tal resulte de um critério educacional compreensível ou de uma escala de valores bem graduada.

Interrogo-me sempre sobre a qualidade do sono dos pais que permitem que os seus adolescentes e jovens, na maior parte dos casos ainda menores de idade, deambulem fora de casa, dia ou  noite dentro, sem qualquer tipo de controlo tutelar. Admito que, para alguns  pais e educadores, isso possa ser  uma alegria, um tempo de recreio em que não têm que se preocupar, achando que os seus filhos são um exemplo e os melhores filhos do mundo. Puro engano. Os seus filhos são iguais aos de todos os outros pais e com comportamentos iguais aos de todos os outros rapazes e raparigas quando deixados em roda livre e “entregues aos cuidados” e "conselhos" do seu grupo de amigos. Mas pelos vistos esses  pais e educadores acham que não e descansam nessa perigosa hipótese. O resultado é o que se vê e que algumas vezes aparece nos meios de comunicação social.

Sim, não peço desculpa por achar que aos filhos e educandos devem ser ensinados, além de outros, também os valores do trabalho enquanto ferramenta  útil de socialização e promoção social e humana e isso nada tem a ver com exploração de trabalho infantil. Mas muitos pais e educadores, quais moderníssimos  pedagogos  acham que os seus filhos devem ser “protegidos” dos “malefícios” dessa aprendizagem, preferindo que eles fiquem entregues a si próprios enquanto não estão na escola, ou quando estão de férias fora desta. E os resultados dessa opção estão à vista na civilidade comportamental das gerações juvenis actuais, na interacção com as gerações mais velhas, na  cada vez maior e incontrolada indisciplina nas salas de aula, na ausência do respeito devido aos professores que os ensinam e na falta de aplicação nos estudos com o insucesso escolar conhecido no país.

Existe um défice de compreensão elevado, da parte de muitos pais e educadores, mas também do estado, quanto a estas matérias e  sobre a sua importância, e alguma coisa precisa ser feita, a começar em casa, no seio familiar, sim, porque é aí que se educam os filhos, mas também no âmbito das  políticas de enquadramento sócio-económico dos jovens e na responsabilização cívica dos pais e educadores que continuam a achar que cabe à escola e não a eles educar os seus rebentos.   


Jacinto Lourenço