segunda-feira, 24 de março de 2014

Lançar Pérolas a Porcos...




Poucos têm a coragem de assumir a ruptura com alguns mantos diáfanos que cobrem fantasias pessoais dissimuladas. No que me diz respeito, nunca sustentei nem me escondi atrás de mantos de ilusão e também não sou especialista na contrafacção da verdade e muito menos domino a 'arte' da dissimulação . Tomo a vida por inteiro, como ela se apresenta, sendo as minhas opções e escolhas pessoais disso consequência, para o bem, para o bom, mas também para as coisas menos positivas que eventualmente me aconteçam. Interrogo-me muitas vezes se poderia ter descrito, em termos pessoais, outra trajectória, sublimado os meus defeitos, melhorado as minhas virtudes; enfim ser uma pessoa diferente em alguns aspectos. A resposta é sim e é não. Por um lado somos sempre resultado das nossas circunstâncias e das opções que tomamos face às mesmas, por outro lado há coisas que nunca conseguiremos mudar, que são intrínsecas a nós próprios, estão nos nossos genes e é isso que faz do ser humano uma criação perfeita; somos, a um tempo, todos diferentes e todos iguais. Claro que poderia sempre ter sido diferente daquilo que sou, mas então já não seria eu.   Foi Voltaire que disse que "Deus concedeu-nos o dom de viver, compete-nos a nós viver bem" .  Viver bem a vida de acordo com a visão daquele que no-la concedeu, sem peias, amarras ou receio de críticas daqueles que discordam de nós, melhorando sempre o que tiver que ser melhorado mas sem jamais correr o risco de pretender parecer outro 'eu', um 'eu' fantasioso, fabricado ou exibido com recurso a artes de prestidigitação.

Nunca tive e não tenho, felizmente, problemas de dupla personalidade ou bipolaridade.
Tenho por hábito dar-me sempre por inteiro, como sou, tal e qual, com toda a  frontalidade e lealdade, à vida que recebi em herança e penhor revestida de tudo o que ela supõe e traz.

Pela manhã estava a ler e a meditar num devocional de Spurgeon onde o autor diz, a dado passo, que "muitas vezes os homens maus carecem tanto de juízo quanto de fé [...], é inutil discutir ou procurar fazer paz com eles porquanto são falsos de coração e enganosos na suas palavras".

Quando inicio  um novo ano de vida, enquadrado igualmente por um novo ciclo, reflicto sobre a forma como muitas vezes  nos prejudicamos por darmos demasiada importância a pessoas que a não têm, que consomem o tempo da sua vida a colocar-se em bicos de pés  apenas para serem vistos ou para exibirem a sua moral e ética fantasiosas e falaciosas, ou ainda fazendo jogos de malabarismos com pessoas. Neste sentido penso que Spurgeon tem razão, que devemos 'sacudir o pó das nossas alparcas' e passar adiante fazendo a jornada da vida com quem se preocupe verdadeiramente com os valores mais elevados que fazem da dela algo que valha a pena ser vivido e não um deserto onde se amontoam esqueletos ressequidos. Isto é: como diz o livro de Mateus, não vou desperdiçar mais nenhum tempo da minha vida a  'lançar pérolas aos porcos'.

Jacinto Lourenço