quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Se os Homens fossem Anjos...



Se os homens fossem anjos nenhuma espécie de governo seria necessária." Esta observação escrita por James Madison em 1788, no debate sobre a Constituição Federal dos EUA, continua a merecer uma validade universal absoluta. Num tempo em que o Estado (em Portugal e na Europa) foi assaltado por aqueles que não só nele não acreditam, mas que o querem ativamente destruir, vale a pena meditar no rosto que poderá assumir a nossa sociedade se as instituições públicas - inventadas pelos homens para o seu autogoverno - continuarem a ser descapitalizadas e desmanteladas. Como muito bem escreveu Hobbes, no século XVII, sem contrato social, sem um poder soberano que garanta a justiça, os homens ficam entregues ao desespero, ao medo, à "guerra de todos contra todos". A construção de uma ordem pública justa está longe de estar terminada. Ainda há poucos anos, o que se passava nessa comunidade de afetos, mas também de poder e violência, chamada família, era considerado como reserva da vida privada: "Entre o marido e a mulher ninguém mete a colher." Hoje, apesar de crime público, a violência doméstica continua a ceifar mulheres. Cidadãs que a lei não consegue proteger contra a tirania e o abuso do mais forte que reinam em muitos lares. Também em muitas escolas crianças são perseguidas pelo preconceito cobarde de colegas a quem ninguém ensina os limites. Os tempos de crise são propícios a libertar a crueldade que todas as pessoas têm dentro de si. Sobretudo quando as políticas públicas que privam as escolas de psicólogos, ou retiram às polícias meios operacionais, acabam por se transformar nos principais catalisadores da barbárie.

Viriato Soromenho Marques in Diário de Notícias